Os resultados do último pleito eleitoral indicam uma inegável vitória dos partidos de centro e centro direita, que conquistaram 82% das 5.519 prefeituras do país, segundo os últimos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Além de esse campo ser fortemente majoritário, conquistando cerca de 4.500 prefeituras, em forte contraste com as cerca de 850 conquistadas pelo campo da centro-esquerda, esse número também cresceu quando comparamos com os dados de 2022. Ou seja, o campo é majoritário e em crescimento.
Em um primeiro momento isso pode parecer estranho em um contexto em que muita se fala em polarização e aumento dos extremos. Para entender isso melhor precisamos ter em conta alguns elementos.
O primeiro que vale mencionar é que estamos falando de eleições municipais, que em geral carregam características próprias e não costumam reproduzir as lógicas das eleições nacionais.
Em segundo lugar, nesse tipo de eleição os partidos políticos contam muito. O que queremos dizer com isso é que suas estruturas, organização e capacidade de coordenação interna são muito importantes. Afinal, são milhares de municípios em que se disputa a prefeitura e a câmara dos vereadores, o que exige muita articulação, montagem de boas nominatas e muito trabalho interno para que os resultados sejam positivos.
Nesse sentido, é mais fácil para um partido conseguir a Presidência da República, como partidos fracos conseguiram com Collor em 1989 ou Bolsonaro em 2018, do que conseguir conquistar parte expressiva das prefeituras do país e, mais importante ainda, manter ou ampliar essas conquistas de maneira consistente.
Isso tudo sugere que ali, na política local, do corpo a corpo, a organização dos partidos e os interesses e necessidades locais contam mais do que uma grande polarização ideológica ou afetiva[1].
Olhando para essa eleição, se considerarmos a polarização política sob a ótica partidária, podemos dizer que apenas duas capitais tiveram uma disputa muito acirrada em torno dos ditos polos, que seriam PT e PL: Foram Fortaleza e Cuiabá.
Deixando de lado os partidos e olhando para os líderes políticos que representam esses polos, tudo apontou também para uma baixa capacidade de influência. Podemos dizer que Lula e Bolsonaro não foram muito bem-sucedidos em influenciar os eleitores. Os nomes que receberam seus respetivos apoios não obtiveram um sucesso estrondoso nas urnas. Pelo contrário: muitos amargaram derrotas.
Ainda podemos mencionar São Paulo como um caso um pouco peculiar, pois, embora seja a capital que costuma chegar mais perto de reproduzir as polarizações nacionais, o último pleito demonstrou algumas coisas ambíguas e que ainda precisarão ser mais bem analisadas, como a presença de uma figura outsider que quase foi para o segundo turno e produziu um racha na direta mais radical.
Curitiba também parece revelar certa falta de coesão nesse espectro político, pois o nome apoiado pelo político Bolsonaro não coincidiu com o nome apoiado pelo partido de Bolsonaro. E lá também seu apoio não se traduziu em vitória eleitoral.
Ainda há muitas coisas a serem melhor entendidas sobre essa eleição, mas nos parece possível afirmar duas coisas: Há um enorme sentimento de rejeição ao que vem representando esses polos. E há, em que pese as diferenças entre as eleições municiais de 2024 e as que virão em 2026, uma via que se abre para os partidos que prezam pela moderação, pelo bom senso e pelo diálogo.
Se esse for o recado que sai das urnas de 2024, é possível dizer que o consistente crescimento do Podemos – aumento de cerca de 30% de prefeituras e de cerca de 60% de vereadores! – é sinal de que o partido está atento ao recado.
[1] Já discutimos esse fenômeno aqui. Cf. https://fundacaopodemos.org.br/blog/acervo-tematico-polarizacao-afetiva-e-eleicoes-no-brasil/