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Economia em Foco: Eleições, Dólar e juros. O que uma coisa tem a ver com a outra?

Economia em Foco: Eleições, Dólar e juros. O que uma coisa tem a ver com a outra?

Introdução:

No domingo do dia 13 de agosto os argentinos foram às urnas votar pelas primárias e sinalizaram, com mais de 30% dos votos, preferência pelo candidato da extrema direita, Javier Millei. Já na segunda feira, 14, as manchetes eram “Argentina eleva dólar oficial em 22%, trava câmbio e sobe juros, após vitória da extrema direita nas primárias”.

Mas por que isso aconteceu? Qual é a relação entre uma tendência eleitoral – de uma eleição que ainda nem se realizou – e as taxas de juros e câmbio de um país? Em outras palavras, qual a relação entre eleição e economia?

É disso que vamos falar aqui.

Turbulência Financeira:

Vamos aos fatos. Já no dia seguinte à vitória de Milei nas primárias, o Banco Central argentino promoveu uma desvalorização do peso em 22% em relação ao dólar, levando a uma taxa de câmbio de 350 pesos por dólar, e subiu em 21 pontos percentuais a taxa de juros, que chegou a 118%. De acordo com a instituição, seu objetivo é “estabilizar as expectativas do mercado”.

Em vão. Ao longo de toda a semana pipocaram matérias sobre as turbulências no mercado. Já na segunda feira, os títulos argentinos caíram 12%, o câmbio paralelo disparou e os investidores externos buscaram vender com urgência as ações que tinham no país, produzindo queda na bolsa de valores.

Talvez a maneira mais simples de explicar isso seja se pensarmos o seguinte: Os “investidores” (que podem ser pessoas ou instituições) possuem dinheiro e desejam aplicar esse dinheiro em algum lugar que lhes ofereça rentabilidade e baixo risco.  Com a “globalização financeira” e abertura dos mercados de capital, os países, com seus governos e empresas, disputam globalmente esses investimentos. Quando surge algum provável futuro governante com discurso muito disruptivo, prometendo mudar tudo radicalmente, isso gera uma incerteza nos “donos do dinheiro”. Como resultado, eles buscam retirar o dinheiro desse lugar.

Pois é isso que vem ocorrendo na Argentina. Quem possuía ações em empresas ou títulos do governo está vendendo essas ações e títulos. Consequentemente, seus preços despencam. Além disso, essas aplicações, denominadas em dólar, estão saindo do país. Ao sair dólar – o país fica com menos dólar – sobe o preço do dólar em relação à moeda local, ou, a mesma coisa dita de outro modo, desvaloriza o peso, o que, por sua vez, aumenta ainda mais a inflação do país, já que ele precisa importar muitas coisas pagando em dólar.

Ora, mas todos os países possuem tamanha vulnerabilidade econômica? A resposta é não. E é aí que entra o caso da Argentina.

 

O Drama Argentino é Estrutural:

A Argentina possui um quadro de graves restrições estruturais, das quais a restrição externa talvez seja a principal. O país sofre de escassez de divisas, o que significa que ela necessita da entrada de dólares para financiar suas importações e fechar a conta do balanço de pagamentos, pois o saldo líquido de suas exportações é negativo, isto é, o país importa mais do que exporta. Aliado a isso o governo opera constantemente em déficits fiscais e a dívida pública é predominantemente externa, isto é, em dólares, ao que se soma os sucessivos calotes realizados em sua história recente. Ou seja, sua credibilidade externa é zero.

Por isso seu financiamento externo depende constantemente de empréstimos do FMI, que em junho de 2018 aportou US$ 50 bilhões, ainda na presidência Macri, empréstimo que foi sucedido pelo acordo atual de março de 2022 no valor de US$ 44 bilhões e com prazo de duração de trinta meses. Uma das maneiras de tentar honrar esses empréstimos é cortar gastos públicos e desvalorizar a moeda local, para incentivar exportações. A primeira medida é impopular e desacelera o crescimento econômico. A segunda, igualmente impopular, acentua a inflação. E a inflação oficial argentina acumulada nos últimos 12 meses ultrapassa a casa dos 115%. A real é possivelmente maior.

E aqui, caro leitor, chegamos ao ponto que gostaria de destacar nesse texto. E ele diz respeito à política.

Diante desse quadro problemático, no qual nem a esquerda nem a direita foram capazes de oferecer soluções e melhorar a situação econômica, surgiu, como tem surgido mundo fora, soluções extremas. Captando a raiva e a frustração de parte da população, Javier Milei oferece soluções simples. E equivocadas. Se dizendo anarco-capitalista, Milei promete dolarizar a economia – uma economia que sofre por falta de dólares – e fechar o Banco Central!

 

Tempestade perfeita:

Todo país inserido na economia global e financeirizada precisa sinalizar alguma previsibilidade para garantir estabilidade.  Os “mercados” precisam disso para precificar riscos de investimentos e margens de retorno, aquilo que os economistas chamam de “aversão ao risco”. Em outras palavras: Eles precisam saber mais ou menos o que vai acontecer – e o que não vai acontecer – para garantir a continuidade dos negócios. Por isso qualquer eleição muito disruptiva pode causar instabilidades.

Mas a Argentina está de parabéns. Ela conseguiu reunir todas as condições de vulnerabilidade econômica diante de um cenário político problemático. Ao colocar na liderança da corrida presidencial – ainda que sejam apenas as prévias – um candidato de discurso fortemente disruptivo, que apresenta soluções fáceis para problemas difíceis, fazendo parte de sua população cair no canto da sereia populista que tem se alastrado pelo mundo, o país cria um cenário de tempestade perfeita.

Que nossos Hermanos aprendam com o que vem ocorrendo em outros países pelo mundo e que tudo sempre pode piorar. E que o façam enquanto é tempo.

Observação: Esse conteúdo não representa, necessariamente, a opinião da Fundação Podemos.

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