fbpx
Fundação Podemos
/
/
Acervo Temático: PL do Veneno
Imagem Destacada Pl Do Veneno

Acervo Temático: PL do Veneno

Na noite do dia 9 de janeiro de 2022, o Projeto de Lei 6.922/2002, apelidado de PL do Veneno, foi aprovado na Câmara dos Deputados com 301 votos a favor, 150 contra e duas abstenções. O PL aguarda o envio ao Senado Federal para apreciação e votação.

O debate público foi intenso entre os detratores e os apoiadores do Projeto de Lei. Ambientalistas argumentam que o projeto irá facilitar a aprovação e o uso de agrotóxicos no Brasil, alijando as agências de saúde e do meio ambiente do processo de aprovação desses produtos. Os apoiadores, por outro lado, afirmam que a nova redação fornece modernização e dá celeridade à aprovação de novos químicos, algo que hoje demora entre 6 e 8 anos.

Este Acervo Temático tem como objetivo expor os argumentos a favor e contra o PL, fornecendo informações sobre o uso de agrotóxicos, o trâmite para a aprovação de novos ingredientes ativos e os possíveis impactos do PL para a sociedade brasileira.

Radiografia do uso de agrotóxicos no Brasil

Os dados utilizados nesta seção foram retirados, de maneira quase absoluta, do estudo “Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia”, da professora doutora Larissa Mies Bombardi, do Laboratório de Geografia Agrária da Universidade de São Paulo.

Primeiramente, precisamos compreender quando e onde são utilizados os agrotóxicos. Analisando a economia brasileira, compreendemos que houve um movimento de “reprimarização” da economia, isto é, após um período em que a manufatura excedia a produção de insumos primários, a produção e exportação destes produtos voltou a crescer. Uma das formas de compreender essa “reprimarização” é analisando a exportação do país por fator agregado.

Entre 1964 e 1978, a exportação de produtos primários ultrapassava a exportação de manufaturados. Essa tendência reverteu-se em 1979, quando os produtos manufaturados tomaram a frente nas exportações brasileiras, algo que se manteve até 2010. Após 2010, os produtos primários voltaram a tomar a dianteira na exportação brasileira.

Coincidentemente, o uso de agrotóxicos no Brasil também cresceu no período em que houve a “reprimarização” da economia. Contudo, é importante anotar que o uso de agrotóxicos começou a se intensificar ainda em meados da década de 2000. Se analisarmos o período de 2006 a 2014, é possível apontar que o Brasil utilizava cerca de 300.000 toneladas de ingrediente ativo em 2006, número que ultrapassou as 500.000 toneladas em 2014.

Desta maneira, para compreender de que maneira o agrotóxico é utilizado, precisamos verificar a produção agrícola do Brasil. Para isso, é importante diferenciarmos a produção de alimento da produção de commodities. Commodities são produtos primários e, portanto, não industrializados, que têm seu preço calculado com base na oferta e demanda do mercado internacional. O Brasil é um grande exportador dessas mercadorias, principalmente de café, soja, trigo e petróleo.

Nota-se, dessa maneira, que esses produtos não compõem a mesa dos brasileiros. Embora haja uma superprodução agrícola no Brasil, trata-se de produtos dedicados para a exportação e muitas vezes para a produção de produtos secundários e industrializados.

Os locais onde mais se utilizam agrotóxicos são os cultivos de soja, milho e cana, que totalizaram 72%, em 2017, dos químicos utilizados para o plantio. O ingrediente ativo mais utilizado no Brasil é o Glifosato, cuja utilização disparou no ano 2012. De acordo com dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a venda de Glifosato em 2011 atingia 131.898 toneladas; esse número saltou para 187.777 em 2012, o que corresponde a um aumento de 42%.

Outra problemática envolvendo os agrotóxicos é o aumento de produtos permitidos. Na figura 1, formulada pelo G1, observa-se que, desde 2016, há uma tendência de aumento de registro de agrotóxicos no Brasil. Se compararmos o número de pesticidas regulamentados no Brasil em 2021 com o número desses químicos registrados em 2000, temos um aumento de 585%. As regiões que mais fazem uso desses químicos são o Centro-Oeste e o Sul do país. Entre os estados, ganha em utilização de agrotóxicos o Mato Grosso, seguido por São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e Amapá.

Fonte: G1

A grande questão é que a utilização de agrotóxicos causa danos à saúde e ao meio ambiente. Entre os efeitos sanitários existe o perigo das doenças agudas, como vômitos, fraqueza, cólicas e doenças crônicas (após meses, anos ou décadas), como aquelas que possuem efeitos neurológicos, comportamentais, embrionários, cânceres, dermatites, dentre outros. Os riscos ambientais englobam a perda de fertilidade do solo, contaminação de água e solo, desequilíbrio dos ecossistemas com a morte de insetos fundamentais para a reprodução do ecossistema, dentre outros.

As regiões do Brasil que registraram o maior número de intoxicação entre 2007 e 2014 foram: o Sul, com 5.547 pessoas intoxicadas; o Sudeste, com 5.473 enfermos; o Nordeste, com 4.005 casos; o Centro-Oeste, com 1.785 pessoas intoxicadas; e o Norte, com 859 casos. Em relação aos estados, os casos ocorreram com maior frequência em Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo e Tocantins. Cabe ressaltar que muito provavelmente houve subnotificação nos índices de intoxicação por agrotóxicos em razão dos sintomas serem comuns, o que pode levar a uma análise clínica que não consiga reconhecer a relação entre a patologia e a intoxicação propriamente pelos agrotóxicos.

Aliás, é importante ressaltar, que as circunstâncias de intoxicação também variam de estado para estado, mas há casos de intoxicação habitual, acidental, por tentativa de suicídio – que configura a maioria dos casos em Pernambuco e no Ceará -, etc. No perfil de pessoas infectadas, nota-se que a maioria são do sexo masculino, negros – com exceção dos estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul, de todas as faixas etárias, inclusive bebês. Além disso, a maior parte das intoxicações ocorre fora do ambiente de trabalho, o que significa que pessoas que não possuem contato direto com a substância podem ser infectadas, seja pelo solo, pela água ou pelo consumo de alimentos, dentre outras possibilidades.

As mudanças do PL 6.922/2002

O PL altera a Lei nº 7.802/1989, que dispõe sobre “ a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências”.

Analisaremos a seguir as principais mudanças propostas pelo PL. A primeira grande mudança se refere à terminologia. Passa-se a utilizar o termo pesticida ao invés de agrotóxico. Além disso, no início do projeto, há importante e positiva alteração, na qual se define um apanhado de termos referentes ao uso e regulação de agrotóxicos, bem como de termos como risco, impureza e dano. A definição do termo não determina, entretanto, o que seria compreendido e quais seriam as métricas de cada um dos efeitos nocivos do uso de químicos, trazendo insegurança legislativa para o controle destes.

O Art. 3º da Lei também é alterado. O citado artigo define os órgãos competentes para a concessão do registro. A Lei determina que participem do processo decisório um órgão federal, como um Ministério, e os órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, meio ambiente e agricultura. Na prática, o registro só é concedido mediante deliberação unanime favorável emitida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e pelo Ministério da Agricultura.

A redação proposta excluiu os setores da saúde e do meio ambiente do processo decisório, desmontando o sistema tríplice. Entretanto, existe uma exceção. No caso de emissão de Registro Especial Temporário (RET), deverá haver a autorização da agência de meio ambiente, mas não de saúde. O Registro Especial Temporário, que pelo projeto deve ser aprovado até 30 dias no máximo, é concedido para pesquisa e desenvolvimento.

Na prática isso significa alijar os órgãos técnicos da saúde e do meio ambiente do processo decisório. Embora estes órgãos possam emitir pareceres e avaliações, a decisão se concentrará no Ministério da Agricultura.

Outra mudança se refere aos prazos. Apoiadores da proposta argumentam que hoje há a demora de 6 a 8 anos para que a concessão de registro de novos agrotóxicos seja concluída. Com o Projeto de Lei, estipulam-se diferentes prazos: para produtos novos (formulados e técnicos), deve-se expedir a concessão em até 24 meses; para produto formulado e genérico, 12 meses; para produto formulado idêntico, 60 dias; para produto técnico equivalente, 12 meses; para RET, 30 dias; entre outros.

Os apoiadores da proposta defendem que ela visa reduzir o prazo de concessão para igualar o Brasil a outros países, que possuem um tempo de análise menor. Entretanto, o PL estipula prazos, mas não garante recursos humanos e financeiros para os órgãos competentes. Encurtar o prazo sem garantir um financiamento mais robusto a esses órgãos poderá, muito provavelmente, levar a erros no processo de análise, enfraquecendo o poder de fiscalização do país.

A proposta também cria dois novos tipos de registro e autorização: o já citado Registro Especial Temporário e a Autorização Temporária. Ambos possuem um período de análise curto, mas será concedido por tempo determinado. Além disso, para a concessão do RET e da AT é necessário que o produto químico seja aprovado por pelo menos três países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

O PL também remove uma importante parte da Lei atual. Atualmente, a legislação proíbe o registro de agrotóxicos que tenham características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas. Essa parte é retirada e não há nenhuma menção sobre este tipo de agrotóxico.

Críticos da proposta argumentam que o Projeto de Lei abre espaço para que substâncias antes vetadas sejam reavaliadas. Além disso, como já tratado, estipular prazos curtos sem a devida participação de órgãos da saúde e do meio ambiente pode aprofundar os danos já sentidos pelo uso de agrotóxicos em larga escala, como foi discutido neste Acervo. Dessa maneira, o PL pode levar a mais intoxicação de pessoas – crônicas ou agudas, bem como causar danos ao meio ambiente – como a contaminação de solo e água. Além disso, não há nenhuma evidência clara de que a larga utilização de agrotóxicos seria fundamental para combater a insegurança alimentar dos brasileiros.

Os impactos que esse Projeto de Lei pode ter na vida das pessoas e no ecossistema podem ser graves, por isso é necessário que o Senado aprecie com atenção e com maior participação da sociedade civil as mudanças trazidas pela Câmara dos Deputados. A atualização da Lei dos agrotóxicos é válida, entretanto as mudanças devem trazer garantias à sociedade brasileira de que os efeitos do uso de químicos serão remediados e estarão sob um forte controle dos órgãos públicos. Afinal, é a saúde de todos nós que está em jogo.

A perigosa retórica dos agrotóxicos como “mal necessário”/Opinião Poder360 (12.01)

Cesar Moraes escreve sobre os riscos do agrotóxicos para a saúde pública, afirmando que o agrotóxico não pode ser visto como a única saída para o aumento de produtividade.

‘PL do Veneno’ aprovado na Câmara: veja como votou cada deputado/Carta Capital (09.02)

“A Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do chamado “PL do Veneno”, apelido dado ao Projeto de Lei 6.922/2002, que flexibiliza o uso de agrotóxicos no País. O projeto voltou a se movimentar depois de uma paralisação de mais de três anos no Congresso Nacional.”

Políticos criticam projeto que apelidaram de “PL do veneno”/Poder360 (09.02)

“Políticos manifestaram-se nesta 4ª feira (9.fev.2022) nas redes sociais contra a votação do Projeto de Lei 6.299/2002, apelidado pela oposição de “PL do veneno”. A votação está marcada para esta tarde na Câmara dos Deputados.”

Câmara aprova projeto que facilita autorização de agrotóxicos/G1 (09.02)

“A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (9) um projeto de lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no país. Foram 301 votos a favor e 150 contrários, além de duas abstenções.”

Marina Silva: PL dos agrotóxicos é Bolsonaro cumprindo agenda da boiada/UOL (10.02)

“A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede) criticou a aprovação do texto-base do PL (projeto de lei) que muda as regras sobre os agrotóxicos no Brasil. Em entrevista ao UOL News realizada pela jornalista Fabíola Cidral e o colunista Josias de Souza, ela classificou o projeto como um “ataque à saúde pública, ao meio ambiente e ao funcionamento das instituições”.”

UE diz que “PL do Veneno” é “preocupante” e ameaça acordo comercial/IG (10.02)

“Anna Cavazzini, deputada europeia pelo Partido Verde e presidente do Comitê sobre Mercado Interno e Proteção do Consumidor do Parlamento Europeu disse nesta quinta-feira (9) que o projeto de lei 6299/2002, que altera o regime de avaliação e aprovação de agrotóxicos no Brasil, chamado de “PL do Veneno”, é “preocupante” e pode colocar em risco um acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. A informação é do colunista Jamil Chade.”

PL do Agrotóxico: Entenda o projeto que flexibiliza a entrada de produtos no Brasil/Terra (10.02)

“O Projeto de Lei 6299/02 foi aprovado nesta quarta-feira, 9, pela Câmara dos Deputados com 301 votos favoráveis e 150 contrários, e agora segue para análise do Senado. O projeto flexibiliza a entrada de novos agrotóxicos no País. O texto tem suscitado debates intensos da oposição e ambientalistas, que tentam impedir o avanço da proposta, mas conseguiu encontrar apoio necessário até aqui.”

Entenda as mudanças que o chamado PL do Veneno pode causar/Folha (11.02)

“Foi aprovado na quarta-feira (9) na Câmara dos Deputados, por 301 a 150 votos, o texto-base do PL (Projeto de Lei) 6.299, de 2002. O projeto, que preocupa entidades ambientais e de saúde, aumenta o poder do Ministério da Agricultura no processo de autorização para novos agrotóxicos.”

A nova Lei dos Agrotóxicos/Opinião Estadão (15.02)

“Em 1989, o Congresso aprovou a Lei dos Agrotóxicos (Lei 7.802/89), um marco jurídico amplo, que regula a pesquisa, a produção, a comercialização, a importação, a exportação e a fiscalização de (i) substâncias cuja finalidade é “alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos” e de (ii) produtos “empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento”.”

“PL do Veneno” causará “danos irreparáveis”, diz Fiocruz em nota enviada aos senadores/Brasil de Fato (14.02)

“Em nota enviada nesta segunda-feira (14) aos senadores, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) chamou a atenção para os danos a serem causados pelo chamado “PL do Veneno” em caso de aprovação do texto pelo Senado. A medida foi provada pela Câmara dos Deputados na última quarta-feira (9) e segue agora para apreciação dos senadores.”

Observação: Esse conteúdo não representa, necessariamente, a opinião da Fundação Podemos.

Compartilhe:
como citar
Últimas publicações
Acompanhe nosso conteúdo
plugins premium WordPress