Na última semana, imagens de balsas no rio Madeira estamparam as páginas dos principais jornais brasileiros. A partir da informação de que teria ouro no leito do rio, dezenas de garimpeiros tomaram a região para a exploração do minério. A prática, não autorizada pela União, é considerada ilegal, além de colocar a vida de comunidades ribeirinhas e indígenas em risco de contaminação. A repercussão sobre o caso mobilizou a Polícia Federal, o IBAMA e a Marinha, que no final de semana destruíram mais de 130 dragas.
Garimpo refere-se à exploração, mineração ou extração de substâncias minerais, como o ouro. A prática não é considerada ilegal, embora deva estar em conformidade com a lei. De acordo com a Constituição Federal, compete à União a determinação de áreas e as condições para o exercício da garimpagem, em forma associativa. Entretanto, a Lei 9.605/98, Lei de Crimes Ambientais, criminaliza a conduta do garimpo ilegal, proibindo “Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida com pena de detenção, de seis meses a um ano, e multa”. Cabe, portanto, à União a regulação da atividade de garimpo.
A prática de garimpo para a extração de ouro possui um impacto ambiental relativamente alto devido ao uso de mercúrio para recuperá-lo nas calhas de lavação de minério. A prática no rio Madeira, impulsionada pela informação de que haveria ouro no leito do rio, é considerada ilegal por não ter sido autorizada pela União. Especialistas apontam, ainda, para o risco do consumo de peixes da região, exatamente pela possibilidade de contaminação por mercúrio, o que pode causar lesões nos órgãos, como o cérebro, rins, fígados e coração, visto que o metal não é expelido e se acumula no corpo. Isso é agravado pelo fato de que, próximo à região, os ribeirinhos e povos indígenas dependem da atividade de pesca para a sua alimentação rotineira. Como forma de controle, agentes públicos fizeram a coleta de fios de cabelo de moradores da região para a análise.
O garimpo ilegal vem chamando a atenção da sociedade brasileira devido à prática nas terras dos Yanomamis. O caso é ainda mais grave pois a garimpagem ocorre numa terra indígena. De acordo com a Constituição Federal, cabe aos indígenas a posse permanente da terra e “o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes” (Art. 231, § 2º), salvo casos autorizados pelo Congresso Nacional (Art. 49, inciso XVI), o que não se aplica para a exploração nas terras Yanomami. Além disso, o contato com garimpeiros ilegais pode promover surtos de doenças e oferece riscos para a população indígena. Em outubro, por exemplo, duas crianças Yanomamis morreram sugadas pelas dragas utilizadas na extração de minério.
A política ambiental do governo Jair Bolsonaro, marcada pela omissão, é um dos grandes pontos de crítica da sociedade civil e da comunidade internacional. Em junho, o Supremo Tribunal Federal se mobilizou para determinar a imediata proteção dos povos Munduruku e Yanomami devido à crescente violência e conflito com invasores das terras indígenas. Ainda, o conflito continua e pouco foi feito pelo governo federal para a proteção destes e de outros povos.
As terras indígenas, para além da importância de garantir o acesso à terra e aos recursos para povos indígenas, possuem relevância na preservação ambiental, visto que suas terras não podem ser utilizadas para a exploração de matéria prima. O governo Bolsonaro foi o único que, em três anos de mandato, ainda não demarcou nenhuma terra.
Outros pontos são criticados na política ambiental do atual governo, sendo um deles o desmatamento ilegal. Os últimos dados do Inpe acenderam o alerta para o desmate na Amazônia Legal. Em outubro, houve um aumento de 5% em relação ao mesmo período do ano anterior. O relatório foi lançado no último dia da COP26 e a sociedade civil acusou o governo de segurar os dados para não os apresentar antes da maior conferência internacional sobre o tema.
Além da Amazônia Legal, um dos grandes biomas ameaçado pelo desmatamento ilegal é o Cerrado. Com grande importância para o ecossistema brasileiro, o Cerrado vem sofrendo com o desmate para a expansão da fronteira agrícola e se tornando um grande pasto para a produção de carne e soja. Estudos apontam, por exemplo, o impacto que tal prática teve na crise hídrica atual devido a retirada de plantas nativas da região, que funcionam como uma espécie de “esponja”, abastecendo os lençóis freáticos em épocas de seca.
Confira as principais notícias sobre as práticas ilegais de garimpo e desmatamento na gestão Bolsonaro:
Por unanimidade, STF determina imediata proteção para povo Munduruku e Yanomami/CIMI (21.06)
“As ministras e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) determinaram, de forma unânime, a proteção dos povos Munduruku e Yanomami para evitar novos massacres. A corte decidiu sobre pedido feito pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pela retirada urgente de invasores, especialmente das Terras Indígenas (TIs) Munduruku, no Pará, e Yanomami, em Roraima, e pela garantia da integridade física das pessoas ameaçadas nesses locais. O julgamento durou sete dias e, na noite do dia 18 de junho, foi confirmada a votação que representa uma conquista para os povos afetados.“
Bolsonaro parou demarcações de terras indígenas e fez explodir ações do MPF/UOL (16.09)
“Alegando espera pela definição do marco temporal pelo STF (Supremo Tribunal Federal), o governo do presidente Jair Bolsonaro aplicou um freio inédito nos processos de demarcação de terras indígenas e causou uma avalanche de ações do MPF (Ministério Público Federal) na Justiça cobrando atos que avancem nos procedimentos legais.”
Crianças ianomâmis foram ‘sugadas e cuspidas’ por draga de garimpeiros, dizem indígenas/Folha (14.10)
“Uma criança ianomâmi morreu e outra desapareceu nesta terça-feira (12) após terem sido levadas pela correnteza no leito do rio que banha a comunidade Makuxi Yano, que fica na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.“
Em meio à COP26, desmatamento na Amazônia aumenta 5% e bate recorde para outubro/O Globo (12.11)
“A área sob alerta de desmatamento na Amazônia Legal em outubro foi a maior neste mês em seis anos, mostram dados do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados nesta sexta-feira. Cerca de 876,6 km2 do bioma sofreram desmate durante o mês, um aumento de 5% em relação ao mesmo período do ano passado.“
Governo Bolsonaro segurou divulgação de dados de desmatamento recorde obtidos antes da COP 26/O Povo (19.11)
“O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) segurou dados sobre o desmatamento no País enquanto a Conferência Climática das Nações Unidas (COP 26) ocorria. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgados na última quinta-feira, 18, mostram que o desmatamento na Amazônia, entre agosto de 2020 e julho deste ano, foi o maior registrado desde 2006, com 13,235 mil km² desmatados no período supracitado.“
Ameaçados por malária e fome e abandonados pelo governo, ianomâmis estão contando com a ajuda de garimpeiros ilegais, diz liderança/O Globo (23.11)
“RIO — Fome, morte, abandono. Esses têm sido elementos presentes na realidade dos povos ianomâmis, nos estados de Roraima e Amazonas. Uma crise que, por si só, já seria grave com o avanço do garimpo ilegal, começa a ganhar contornos cada vez mais dramáticos à medida que um novo surto de malária — problema conhecido da região — tem resultado na morte sobretudo de crianças no território, de acordo com lideranças. Só da semana passada para cá, duas teriam morrido desnutridas, em geral, uma consequência da doença. Sem assistência, os indígenas têm recorrido a garimpeiros ilegais para obter ajuda e remédios.“
Centenas de balsas de garimpo lotam rio Madeira em corrida por ouro/UOL (24.11)
“Manaus, Amazonas (Reuters) – Centenas de balsas de dragagem operadas por garimpeiros empreendem uma corrida por ouro no rio Madeira, importante afluente do Amazonas, navegando por vários quilômetros enquanto as autoridades estaduais e federais discutem quem é responsável por impedir a ação ilegal.”
Garimpo na Amazônia: o que está por trás da invasão do rio Madeira/BBC (25.11)
“Desde a quarta-feira (24/11), fotos e vídeos feitos no rio Madeira, a pouco mais de 120 km de Manaus, causaram indignação no Brasil e no exterior.“
“O mercúrio usado na atividade ilegal de garimpo no rio Madeira é capaz de causar lesões nos órgãos das pessoas que se alimentam todos os dias com peixes contaminados, pois apresentam sintomas mais crônicos do minério do corpo.“
Operação contra balsas de garimpo no Rio Madeira destruiu 131 dragas/Estadão (29.11)
“Após três dias de incursões contra balsas clandestinas de garimpo ao longo do Rio Madeira, a Operação Uiara destruiu 131 dragas, principal equipamento usado nas embarcações para sugar o leito do rio, em busca de ouro. Foram 69 dragas destruídas no sábado e outras 62 no domingo. O trabalho foi executado por grupamentos táticos da Polícia Federal, Ibama e Marinha.“
Após PF destruir mais de 130 balsas, prefeitos acionam Brasília para paralisar operação contra garimpo no Rio Madeira/O Globo (29.11)
“BORBA (AM) – O prefeito de Borba (AM), Simão Peixoto (PP), afirmou nesta segunda-feira que acionou a bancada federal do Amazonas com o intuito de paralisar a destruição de balsas de garimpo, que operam na ilegalidade no Rio Madeira. A Polícia Federal e o Ibama já incendiou mais de 130 embarcações desde sábado, quando foi deflagrada a operação Uiara. Embora a PF não informe oficialmente, O GLOBO apurou que três pessoas foram presos.“
Garimpo como modo de vida: o drama ambiental que assola o Rio Madeira/Estadão (30.11)
“Foi pela janela de sua casa de madeira, na pequena comunidade do Remanso, que Jair Cabral Silveira viu uma horda de garimpeiros avançar com suas balsas ladeadas pelas águas do Rio Madeira. Correu para o terreiro para tentar entender o que estava acontecendo. Em seus 74 anos, o ribeirinho que vive em Autazes acostumara-se à rotina das balsas clandestinas que cortam o rio para dragar o leito do rio amazônico em busca de ouro. Mas daquela forma, agrupadas em filas de um lado a outro do rio, não.“
O dia a dia do esquema de extração ilegal do ouro no Rio Madeira/O Globo (04.12)
“AUTAZES (AM) – Na última semana de novembro, o Rio Madeira, que de uma margem a outra parece um mar (com uma largura média de cinco quilômetros), ficou pequeno na altura da vila centenária de Rosarinho, em Autazes (AM). Mais de 400 balsas de garimpo, conhecidas como “dragões” pelas “garras” de madeira, ferro e tubos que saem das estruturas em meio à fumaça preta expelida dos motores de caminhão, enfileiraram-se como uma cidade flutuante, com cerca de três mil pessoas — 60 vezes mais que a população da comunidade ribeirinha, de 50 habitantes, formada por descendentes do povo indígena Mura.“
General Heleno autoriza avanço de garimpo em áreas preservadas na Amazônia/Folha (05.12)
“O general Augusto Heleno, ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) da Presidência, autorizou o avanço de sete projetos de exploração de ouro numa região praticamente intocada da Amazônia, gesto inédito do Conselho de Defesa Nacional nos últimos dez anos.“