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A Resenha: Alcarràs

A Resenha: Alcarràs

Eu não canto pela voz, […] por quem canto é por minha terra, terra firme, casa amada

Um filme sobre tradição, família e acesso à terra. Alcàrras (2022) é uma produção espanhola e italiana da jovem diretora Carla Simón.

Ambientado na Catalunha, o longa mostra o trajeto de uma família que não possui a documentação das terras que usam para a plantação de pêssegos. Elas foram um presente de uma família de proprietários, os Pinyols, que foram acolhidos pelos pequenos produtores durante a Guerra Civil da Espanha.

Inicialmente, a família de donos de terra tenta vender a ideia de usar o terreno para a instalação de painéis de energia solar. Algo rechaçado pela família Solé. Sem a documentação de suas terras, o longa vai mostrando de que forma a tradição vai se desfazendo; isto é, a terra que passou de geração em geração, e como a própria família vai se desintegrando.

Um grande ponto do longa é que não existe personagem principal. Ou seja, não há quem ganhe destaque maior em relação ao outro; a própria família é o personagem principal. O pai, Quimet (Jordi Pujol), e a mãe, Dolors (Anna Otín) possuem três filhos: Roger (Albert Bosch), Mariona (Xènia Roset) e Iris (Ainet Jounou).  São eles mesmos que fazem a colheita para vender os últimos frutos antes do desmatamento da terra para a instalação de painéis solares.

Ainda, temos outros personagens como o cunhado Cisco (Carles Cabós) e sua esposa Nati (Montse Oró), com seus gêmeos Pau (Isaac Rovira) e Pere (Joel Rovira).  Temos, além deles, o patriarca Rogelio (Josep Abad) e a irmã que saiu da cidade catalã Glòria (Berta Pipó).

Uma grande contribuição do longa é pensarmos de que maneira novos padrões de se fazer dinheiro se impõem sobre a tradição. A última colheita acompanha a desintegração da família, que um dia trabalhou conjuntamente para fazer a sua subsistência. Rogelio ainda busca manter o laço com os Pinyols, mas o novo primogênito da família pouco se interessa com a produção de pêssego, buscando ganhar dinheiro com a produção de energia solar.

Tudo isso é feito de forma linear: o que sabemos do passado é contado por Rogelio aos netos, mantendo a tradição e a história oral da família. Outro ponto que leva o filme a imitar a vida é a falta de clímax ou de um plot twist. Sabemos, desde o início, que as terras serão utilizadas para a produção de energia solar, mas, assim como a família Solé, pouco sabemos em que momento isso se dará. Além disso, sem conflitos diretos – salvo algumas exceções – os personagens conseguem transpassar as suas angústias de maneira bastante sutil, seja se recusando a fazer alguma coisa, mostrando falta de interesse, ou, até mesmo, chorando.

A beleza de Alcàrras, então, é contar a vida como ela é, se utilizando de um tema tão necessário e importante: o acesso à terra e a produção do pequeno agricultor. Outro ponto forte da obra prima é a escolha de casting: trata-se de novatos da região da Catalunha, que pouco ou quase não possuem relação com a indústria cinematográfica. Isso faz com que o longa se aproxime cada vez mais da vida real. Apesar da inexperiência, nenhum dos personagens entrega uma atuação forçosa ou pouco convincente, tudo ali é extremamente bem pensado e executado. Isso traz também pintadas de realismo à obra.

A obra fictícia foi escrita por Simón ao lado de Arnau Vilaró, que vem de uma família de agricultores da Espanha, o que garante, ainda mais, traços de realidade. Obviamente uma produção como esta merece prêmios e foi o que ficou decidido no Festival de Berlim de 2022, quando o longa foi premiado como Melhor Filme do festival. Pelo Brasil, foi exibido na 46ª edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, na Competição de Novos Diretores. A mostra, que está se tornando um termômetro de filme independente no Brasil, consegue angariar espectadores das mais diversas idades para conferir filmes que normalmente não seriam exibidos no cinema.

Com duas horas de duração e para maiores de 16 anos, Alcàrras está disponível na plataforma de streaming Mubi.

 

Observação: Esse conteúdo não representa, necessariamente, a opinião da Fundação Podemos.

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