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A Resenha: As três filhas

A Resenha: As três filhas

Poucos filmes conseguem aliar a simplicidade visual a uma narrativa tão densa e complexa como As três filhas (2023), longa do diretor Azazel Jacobs. Estrelado por Carrie Coon (Fargo e A garota exemplar), Elisabeth Olsen (Wanda Vision) e Natasha Lyonne (Orange is the new black), o filme conta a história de três irmãs que se reúnem para a despedida do pai.

Katie, Christina e Rachel são as filhas de Vincent (Jay O. Sanders), que recebe cuidados paliativos, por conta de um câncer em estado terminal, na casa onde sempre morou em Nova York. Katie (Carrie Coon) é a filha mais velha, que mora na mesma cidade. Christina (Elisabeth Olsen) a filha mais nova, que mora muito distante do pai. Tanto Katie, quanto Christina são filhas do primeiro casamento de Vincent. Rachel (Natasha Lyonne) é a enteada que ele criou como filha, não diferenciando das suas outras duas. Tanto Katie como Christina são casadas e têm filhos, enquanto Rachel, solteira, mora junto com o pai e dele cuida. Tanto a mãe de Katie e Christina é falecida, como também a de Rachel. Vincent é um homem duplamente viúvo, que agora enfrenta dolorosamente a doença que em pouco tempo vai lhe tirar a vida.

O enredo é extremamente simples. Ou seja, são as três filhas de um homem que se reúnem na antiga casa para darem o adeus ao pai. Contudo, na simplicidade do encontro, três mundos desconectados e distantes se reaproximam por conta daquilo que os une: o amor ao homem que as criou. Katie é a filha que passa por uma crise de meia idade, com problemas no casamento, já um pouco frio e desgastado e com as dificuldades em lidar com uma filha adolescente. Christina, por sua vez, é a que parece ser a ponte entre as duas outras irmãs, principalmente em razão de sua sensibilidade. Ela tem uma pequenina filha, de apenas três anos, por quem é completamente apaixonada. Rachel é a filha que a princípio parece ter mais dificuldade em lidar com a condição do pai e que se sente invadida por receber as duas irmãs na casa da família, onde sempre morou, principalmente por Katie, que se irrita com os modos dela.

O encontro das três irmãs começa com muitos desencontros pessoais. Os problemas e os rancores que elas têm guardados acabam vindo à tona, por conta do momento de tristeza que passam. Cada uma procura reagir do modo que consegue ao fato de que o pai está morrendo ali, no quarto, ao lado delas. Katie é uma montanha de tensão e problemas, Christina não consegue lidar bem com a tristeza e os choques entre as irmãs, Rachel parece fugir de tudo e procura abrigo a todo tempo na maconha que costuma fumar para relaxar.

Enquanto tudo isso acontece, uma equipe de cuidadores auxilia as três irmãs no tratamento para diminuir a dor que o pai delas sente nessa fase terminal. Angel (Rudy Galvan) é o chefe dessa equipe que parece o tempo todo querer acelerar o processo de morte de Vincent. Sua figura é ambígua, pois ao mesmo tempo que parece querer oferecer todo conforto para o enfermo, nunca hesita em tolerar medidas potencialmente antiéticas.

Uma das coisas que mais chama a atenção no drama é a simplicidade com que as cenas são tomadas. Há pouquíssima variação de ambiente e tudo se passa dentro da casa de Vincent, que praticamente não aparece no longa, exceto no final. Aliás, esse é um dos elementos mais formidáveis do roteiro, pois enquanto as três irmãs sofrem com o processo de luto e com a dor que as coloca novamente frente a frente, o pai praticamente paira como uma sombra, um espírito que as espera, observa e que é interpretado de uma forma diferente por cada uma delas. O embate entre elas envolve os rancores, as mágoas guardadas, mas também as lembranças que as unem e o carinho adormecido que sentem uma pela outra.

Katie, Christina e Rachel são três irmãs que, na realidade, poderiam ser qualquer um de nós. Os problemas pessoais que possuem, as dores que sentem e o sentimento de incompreensão que têm, não somente uma para com as outras, mas em relação a muitas outras coisas pessoais são coisas que cada um de nós pode experienciar em algum momento de nossas vidas. A realidade com que seus dramas são expostos, torna, inclusive, toda a narrativa muito verdadeira e universal. Além disso, o luto é tratado de uma maneira dura, porém ainda poética. Se por um lado a efemeridade da vida é um difícil drama com o qual todos nós nos depararemos um dia, por outro lado a possibilidade do amor ser realmente o laço de eternidade a nos conduzir nessa curta e dolorosa trajetória é o alívio que nos sustenta.

É muito delicado e bonito observar que quanto mais as três irmãs se focam naquilo que as une, mais o processo de conciliação delas se torna possível. Aliás, um processo de conciliação que extravasa a própria relação entre elas, mas que também penetra naquilo que elas foram com o que são hoje. Ou seja, não é algo que toca somente a relação entre elas, mas também o passado e o presente de cada uma. As meninas do pai de quem agora se despedem cresceram e se tornaram as mulheres que de alguma forma se distanciaram daquela infância que as conectava. O momento da morte de Vincent, aliás, é triste, mas lindo ao mesmo tempo. Vale aqui também o registro de que a atuação das três atrizes é impecável.

Por fim, As três irmãs é um belo filme sobre a vida. Embora a presença da iminente morte traga uma angústia que paira como um fantasma durante toda a história, é sobre a vida que ela realmente trata. Afinal, um dia todos nós nos encontraremos com a morte, mas, talvez, seja a forma com que lidamos com ela que pode realmente nos ajudar a viver.

 

 

Observação: Esse conteúdo não representa, necessariamente, a opinião da Fundação Podemos.

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